Imagino que todos vocês tenham acompanhado a tragédia sem precedentes, mas de certa maneira previsível, que assolou o Rio Grande do Sul recentemente. As cenas são de cortar o coração: bairros inteiros submersos, milhares de desabrigados, e perdas incalculáveis em vidas humanas e animais. Esta situação não se limita apenas ao aspecto financeiro; a dor é profunda, tanto psicológica quanto de saúde pública.
Aqui mesmo, no Mais Região, saíram diversas reportagens sobre o fato.
O que mais inquieta é saber que muitos desses danos poderiam ter sido mitigados. A ciência vem alertando há décadas sobre as mudanças climáticas e suas consequências. Relatórios do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) têm apontado categoricamente para uma frequência crescente de chuvas intensas. A resposta a esses avisos, ou melhor, a falta dela, revela nossas práticas equivocadas de produção, consumo, degradação, uso e ocupação do solo. Insistimos em construir em áreas de risco, propensas a alagamentos, e agora estamos colhendo os frutos amargos dessa negligência.
Mas o problema não para aí. Obras essenciais de contenção de cheias e prevenção de alagamentos, com orçamento aprovado há mais de uma década, nunca saíram do papel. Agora, estamos sentindo a falta dessas infraestruturas em um momento crítico. Quem se responsabiliza por essa omissão? Será que o descaso vai ficar impune mais uma vez?
Uma questão central que precisamos abordar é o mapeamento de áreas de risco. É fundamental identificar as áreas mais suscetíveis a enchentes e inundações por meio de um mapeamento preciso. Isso permite uma melhor gestão do território e direcionamento de recursos para áreas mais vulneráveis. Além disso, a construção e manutenção de sistemas de drenagem pluvial eficientes, diques e barragens podem ajudar a controlar o fluxo de água e reduzir o impacto das inundações. E, claro, a manutenção desses sistemas é crucial para garantir sua eficácia a longo prazo (o que não aconteceu em Porto Alegre).
A conservação e restauração de áreas úmidas, florestas e zonas de amortecimento naturais são estratégias igualmente importantes. Estas áreas ajudam a absorver a água da chuva e a reduzir a velocidade do escoamento, diminuindo assim o risco de inundações. Paralelamente, é vital implementar regulamentações de zoneamento que limitem o desenvolvimento em áreas de risco, evitando a construção em leitos de rios, encostas íngremes e áreas de inundação recorrente.
Outro aspecto crucial é educar a população sobre medidas de precaução e planos de evacuação em caso de emergência, podendo salvar vidas e reduzir danos materiais. Não se pode repetir o mesmo modelo de infraestrutura e produção como se estivéssemos vivenciando algo único, que jamais se repetirá. Pelo contrário, os dados apontam que eventos climáticos extremos ocorrerão com maior intensidade e frequência.
Um levantamento feito pelo Escritório das Nações Unidas para a Redução do Risco de Desastres (UNDRR) concluiu que para cada dólar investido na redução e prevenção de riscos, pode-se poupar até 15 dólares na recuperação pós-desastre. Cada $ investido em infraestruturas resistentes a catástrofes poupa quatro $$$$ em reconstrução.
Outra questão séria é sobre como será a reconstrução daqui para frente. Precisamos aprender com o passado. Não podemos reconstruir infraestruturas e áreas residenciais nos mesmos lugares de sempre, repetindo os mesmos erros. É insano gastar recursos recuperando o que já foi destruído várias vezes. Precisamos repensar nossas cidades, criando faixas de proteção e afastando as zonas residenciais das margens dos rios, desocupando terrenos baixos e úmidos. Esta é uma oportunidade de transformação, não apenas de reconstrução.
O desafio é imenso, mas também é uma oportunidade para fazermos diferente. É hora de ouvir a ciência, planejar com inteligência e agir com responsabilidade.
Até a próxima, e cuidem-se.
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